Thursday, December 29, 2016

O Grupo Ivanhoé


Anúncio do Grupo Ivanhoé na Folha da Tarde


No dia 11 de setembro de 1971, a folha da Tarde anunciava: "Paulistas descobrem o Sul com a Ivanhoé". A empresa, na verdade, era paulista e capitaneada por um grupo de jovens que haviam ganho um bolão na Loteria Esportiva. Com a Ivanhoé, eles queriam criar uma espécie de holding, abarcando desde um banco de crédito imobiliário até uma agência de notícias. Aliás, anunciavam desde já uma publicação própria, a Alhos e Bugalhos, produzida pela recém fundada Ivanhopress.

No entanto, foi um necrológio, publicado na edição de 20 de outubro daquele mesmo ano que se soube mais sobre a megaempresa. Tratava-se de convite para enterro de Pedro Louzada Balaustre, que seria ocorrida na cidade de Muçum. O texto também destacava as ramificações do grupo. o Correio do Povo também deu notícia do infortúnio, pormenorizando o perfil do falecido presidente da Ivanhoé Produções "aos 84 anos".

No mesmo dia, a Folha divulgava um "comunicado" (reprodução acima) que repercutiu inclusive na Assembléia Legislativa. Um deputado da região de Muçum que, pedindo espaço na ordem do dia, comunicou o passamento do ilustre conterrâneo.

O Diário de Notícias de 22 de outubro trazia reportagem sobre Balaustre, intitulado pelo jornalista que assinava a matéria, Janer Cristaldo, de "Lincoln do oeste paranaense". O texto também destacava a importãncia do falecido em várias esferas públicas e até culturais.

Três dias depois, Pedro Louzada Balaustre Júnior divulgou ao seu público externo — acionistas, autoridades civis e eclesiásticas — relatório da Ivanhoé Produções a respeito das novas ramificações do grupo: Ivanhoaço (Aços Finos Ivanhoé), Ivanhoair, Ivanhomem (uma espécie de Mobral), Ivanholac (Laticínios) Afugi (Associação de Funcionários da Ivanhoé), Ivanhocard, Ivanhoterra, Ivanhojuris, Ivanhomed, Ivanhoquímica e Ivanhofértil.

No fim, o relatório resume biografia de Balaustre, destacando seu começo no seio da terra, seus esponsais com Carmelita Umbrella, a matriarca da família e protetora das artes. Carmelita era uma fusão de Darcy Vargas, Anita Malfatti e Lina Bo Bardi. Perplexo com o relatório, o advogado e professor de Direito Antônio Martins Costa mandou carta à Louzada Jr. dando enorme apreço ao finado patrono, "exemplo de amor e dedicação e de bem servir".

Semanas depois, a imprensa seguia repercutindo as ações da Ivanhoé. A coluna de Antônio Carlos Porto (De Alto a Baixo) dava votos de boas festas à Dona Carmelita, que iria lançar pedra fundamental do Orfanato Pedro Balaustre; Ataíde Ferreira, na Folha Esportiva retribuía mensagem de fim de ano de um certo Alberto Umbrella, do clube Fortes e Livres, da cidade de Muçum.

No dia 31 de dezembro de 71, Carlos Coelho, no Informe da Zero Hora, dava um furo: Gabril Inellas, loco-tenente geral da Ordem Hospitalar de São Lázaro, anunciava interesse em adquirir o controla acionário da Ivanhoé Produções. Fez-se a polêmica: dado o processo de translado de uma grande empresa gaúcha do cone sul, cogitou-se, à guisa de solução imediata e salvacionista, a reativação da Micronorte, empresa vetusta que fora criada quando o Bicre-Banco Ivanhoé de Crédito Republicano, sob ameaça de ser absorvido pela Unidesco, foi salvo em cima do laço por uma operação deus ex machina (ou quase excusa?) da Holding Midas, que contou com o auxílio da Ourivesaria Balaustre, Refinaria de Petróleo Dilúvio S.A e a Metalúrgica Umbrella S.A.

A coisa engrossou quando um certo grupo econômico criou campanha publicitária sobre seu respectivo presidente, posto a ombreá-lo com o desaparecido Pedro Balaustre. A resposta veio incontinente de Balaustre Jr, que respondeu à matéria, ameaçando acioná-lo na Justiça através da Ivanholex (Advocacia), dadas a farta documentação franqueada pela Ivanhoinform — Espionagem e Sigilos Industriais. Contudo, antes que a polêmica ganhasse vulto, desapareceu por completo.

Repercutindo o caso, porém, a edição de 4 de julho de 72 da Zero Hora trazia um furo, dado em primeira mão por Aspecyr Umbrella, da Ivanhopress: estavam em negociações uma possível cinebiografia de Louzada Balaustre. Enquanto isso, o Grupo Ivanhoé crescia: foram fundadasa a Ivanhodog (rede de lanchonetes fast-food, em moda na época em Porto Alegre, com o advento do cachorro-quente), Ivanhonasa (Rede de Comunicação), Ivanhoféretro (ramo funerário), Ivanhoar (refrigerações industriais e domésticas), Ivanhocar, Ivanhobrás (aproveitando a onda de civismo dos anos 70) e, por fim, a Rede Ivanhoé Sul de Comunicações. Tudo sempre ganhando relativo espaço na imprensa porto-alegrense.

Em notas e rodapés de colunas, também surgiram outros desdobramentos do Grupo Ivanhoé: da parceria comercial com o Grupo Habeas Corpore (rede de supermercados Império S.A), e o surgimento de franchises, como as Boutiques Carmelita, Empresa de Táxi Bandeira 3, Roupas Íntimas Jandira S.A, Cabanha Ivanhoé, Haras Ivanhoé, Ivanhoave (Aviário Ivanhoé), a novos braços tentaculares da Ivanhoé Produções — até a Ivanhoerva (empresa de fomento ao plantio de gererê).

A imprensa também dava conta de uma futura escuderia, o Balaustre's Racing Team, disposto a suplantar a Coopersucar. O patrocínio dos bólidos, é claro, é do Banco Ivanhoé S.A.



Tempos depois, descobriu-se a o Grupo Ivanhoé só existia na cabeça dos idealizadores da brincadeira: Rogério Mendelski, José Antônio Pinheiro Machado, depois contando com a ajuda dos demais citados (aliás, Luiz Fernando Verissimo ficava responsável pelos artigos de fundo, como o reproduzido acima). O mico ficou por conta de próceres tanto da Assembleia do estado quanto do Congresso, que entraram para os anais com seus respectivos votos de pesar, proferidos no púlpito ao passamento do patriarca da inexpugnável Ivanhoé Produções.

E do pároco da Matriz de Muçum, que realmente preparou a igreja para as exéquias do inesquecível Pedro Balaustre. ^



PS: a história sairia, com riqueza de detalhes, no livro Anedotário da Rua da Praia 2 (o melhor dos três), do renato Maciel de Sá Júnior.




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