Wednesday, April 06, 2011

Ponteio

Há exatos 46 anos, em 1965, Edu Lobo ganhava o Festival da Canção da TV Rio, com Arrastão, defendida pela Elis.

Isso me lembrou um trecho do Noites Tropicais, do Nelson Motta. O livro, que narra em primeira pessoa os bastidores do mundo mundo vasto mundo cultural brasileiro das últimas cinco décadas, ele diz que, depois do sucesso de Arrastão, Edu se montou: gravou três discos e, com o Gianfrancesco Guarnieri, lançou o Arena Canta Zumbi. O auge seria uma mega-produção no Zum-Zum, com o Baden Powell e a Elis (Regina).

Quando iriam começar os ensaios, Edu recebeu um convite para uma turnê na Europa e não pensou duas vezes. Chegou no Rio cinco meses depois.

De volta, o autor de Borandá notou que tudo havia mudado. O novo xodó da mídia agora era o moreno dos olhos d'água Chico Buarque de Holanda, Wilson Simonal levantava multidões, Vandré era o novo ícone da esquerda festiva, Gil e Caetano lançavam seus primeiros trabalhos em disco. Pior: faltava pouco tempo para o encerramento de inscrições do próximo Festival e edu não tenha nada para o certame.

Antes da turnê, porém, ele ouviu a nova canção que Dori Caymmi queria inscrever para a competição. Gostou tanto que o filho de Dorival perguntou se ele não queria pôr letra. Edu chegou a pensar em algo mas achou melhor não se intrometer na parceria de Dori com o próprio Nelson Motta (juntos tinham feito Saveiros).


Contudo, da parceria frustrada, ele ficou com um refrão boiando na mente: "quem me dera agora eu tivesse a viola prá cantar". Resolveu transformar esses versos no refrão de um galope que ele havia esboçado (na linha de protesto entronizada por ele e pelo Vandré de Disparada) e convidou Capinam para fazer a letra. Edu apenas sugeriu o tema, e o poeta baiano fez o resto.


A competição do III Festival da Record de 67 foi o ápice do gênero na década de 60. Tanto que pelo menos os quatro primeiros colocados mereciam o primeiro lugar. A despeito da enorme concorrência, foi justamente a canção de Edu Lobo que ganhou o certame: era Ponteio, defendida por ele, Maria Medalha, Airto Moreira, o Quarteto Novo, orquestrada por ninguém menos que Rogério Duprat.



Ponteio foi a última canção "engajada" a ganhar um festival por aqui. Ao mesmo tempo que o gênero foi se desgastando, o próprio FIC, que virava uma espécie de catalisador político naqueles anos marcados pela ditadura militar, ele foi sendo paulatinamente esvaziado na medida em que os canais ditos de 'participação popular' na época iam se fechando e o público começava a ver que onde se acreditava haver uma forma de mudar a realidade havia apenas música.

O canto do cisne seria a final do FIC de 68, quando o público quis Vandré e os seus dois acordes de "Caminhando" e o júri escolheu a jobiniana Sabiá. quando o Festival da Canção foi capitaneado pela TV Globo, a partir de 69, o FIC já havia se transformado em udigrudi, sob as bênçãos do governo militar - como explica Zuza Homem de Mello, no livro A Era dos Festivais.

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