Thursday, April 14, 2011

As 14 canções brasileiras do século


Ari Barroso


Há um tempo atrás, o Ricardo Cravo Albin lançou um concurso envolvendo 13 notórios conhecedores de música popular brasileira. A tarefa era escolher as 12 canções de MPB de todos os tempos.

A tarefa impossível foi anunciada na época na Academia Brasileira de Letras. Claro que muita coisa teve que ficar de fora, como foi o caso da produção musical dos anos 80 e 90 do século passado. Para facilitar, Albin resolveu aumentar a lista para quatorze.

Muita gente vai estranhar Se Você Jurar, do Ismael Silva na lista, já que ela não é tão conhecida quanto as demais. Ela entra provavelmente mais por sua importância história, a despeito de ter se tornado um sucesso na época de lançamento e ser um dos grandes clássicos do samba de todos os tempos. Se você não a conhece, então você não entende nada de samba, caro leitor.

A mais votada (12 de 13) foi Aquarela do Brasil, de Ary Barroso. A lista ficou assim. Tentei colocá-las em suas respectivas versões originais:

1. Aquarela do Brasil (Ary Barroso, 1939, 12 votos). Mesmo sendo acusada na época de criação típica do Estado Novo em seu estilo de samba exaltação, Aquarela foi o primeiro sucesso internacional de uma canção daqui. Consta que Walt Disney estava no aeroporto de Belém quando ouviu a música do Ari e resolveu fazer um filme, que viria ser Você já foi à Bahia.



2. Carinhoso (Pixinguinha e João de Barro, 1937, 9 votos). Pixinguinha a compôs como um choro para flauta em 1917. Ela ganhou versos somente vinte anos depois, quando uma cantora pediu à ela que a transformasse em canção. A cantora, Heloísa Helena, indicou entçao Braguinha para a letra. A primeira gravação porém seria de Orlando Silva.




3. Asa Branca (Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira, 1947, 9 votos). Criada em cima de um tema folclórico que o Rei do Baião ouvia na sanfona de seu pai, Asa Branca era meio desacreditada por ele quando mostrou a canção para Humberto Teixeira. O resultado foi um sucesso: além de mostrar Luiz Gonzaga para o Brasil, Asa Branca mostrou o baião para o mundo.



4. Último Desejo (Noel Rosa, 1937, 8 votos). Espécie de canto do cisne de Noel, Último Desejo conta a história da relação entre o Poeta da Vila e Ceci, a "dama do cabaré", Juraci Moraes, que como diz a música, eles se conheceram na boate Apollo numa noite de são João. Quando Aracy gravou o samba, Noel havia morrido poucos dias antes, minado pela tísica galopante que o levou aos 27 anos.



5. O Que Será (À Flor da Pele) (Chico Buarque, 1973, 7 votos). Conhecida inicialmente por causa do filme Dona Flor e seus Dois Maridos, O Que Será, que saiu no disco Meus Caros Amigos, de 1976, representava o ápice criativo de Chico Buarque durante os anos 70. Também possui outras duas letras, que foram registradas posteriormente por Mílton Nascimento e Simone.





6. Chega de Saudade (Tom Jobim e Vinícius de Moraes, 1957, 7 votos). samba-canção divisor de águas na história da MPB, criando um estilo que catalisaria boa parte da produção musical autóctone que mais tarde seria enlatada como MPB. A gravação orignal, no entanto, coube à elizeth Cardoso no disco Canção do Amor Demais, de 57. Porém, a versão de João seria e é a definitiva.




7. Alegria, Alegria (Caetano Veloso, 1967, 6 votos). Considerada por Augusto de Campos como a retomada evolutiva da Bossa Nova, Alegria Alegria era a carga de cavalaria do tropicalismo, que queria deglutir de forma críica e criativa a cultura de massa. Com sua letra modernista em estilo câmara-na-mão, no entanto, ela acabou logrando um terceiro lugar no Festival da Record. Mas em geral esse é o destino das obras-primas.




8. Se Você Jurar (Ismael Silva e Nilton Bastos, 1931, 6 votos). Primeira grande dupla de bambas do samba, os ases da Deixa Falar (depois Estácio) lançaram uma série de sambas antológicos no começo dos anos 30, a maioria para abastecer o repertório de outra dupla, Mário Reis e Francisco Alves. Se Você Jurar é a signature song do niteroiense Ismael Silva, autor de outros clássicos, como Adeus, Antonico, Para me Livrar do Mal e Novo Amor, entre outros.



9. Chão de Estrelas (Orestes Barbosa e Sílvio Caldas, 1937, 6 votos). Sílvio e o jornalista e poeta Orestes têm juntos uma série de serestas geniais, como Serenata, que era o tema de abertura do programa do Caboclinho na Rádio Nacional ou Arranha Céu, uma canção de letra impressionista e modernista mas com uma melodia de modinha imperial. Mas foi com Chão de Estrelas que eles se tornariam conhecidos em todas as partes. Manuel Bandeira dizia que "tu pisavas nos astros distraída" era um dos mais belos versos em língua portuguesa. Outro poeta, Guilherme de Almeida, seria o criador do título da seresta, que Orestes chamava de "Sonoridade que Acabou".



10. As Rosas não Falam (Cartola, 1975, 6 votos). Cartola estava esquecido do mundo (ele conseguiu algum sucesso nos anos 30 com Divina Dama, gravada por Chico Alves, mas se desiludiu com o mundo do disco e do rádio) quando Stanislaw Ponte Preta o achou lavando carros em Ipanema. Tratou de relançá-lo ao estrelato, já em idade provecta. Nos anos 70, Cartola continuaria ativo e lançaria dois discos geniais, e a sua obra-prima, as Rosas Não Falam.



11. O Abre Alas (Chiquinha Gonzaga, 1899) Compositora prolífica e inteligente, Chiquinha fazia música e vendia através de pregoeiros, ou ela mesma vendia, de porta em porta. Na virada do século, em 1899, o rancho carnavalesco Rosa de Ouro, do Andaraí, lhe pediu um tema para o tríduo momesco de 1900. Chiquinha compôs uma marcha, que acabou virando um gênero musical por excelência dentro do Carnaval brasileiro.




12. O Mar (Dorival Caymmi, 1939, 5 votos). Uma pequena suíte trágica que mostra o contraste da beleza do mar e a história de um pescador que perde a vida nas águas. seria a mais conhecida de seu ciclo de canções praieiras contando crônicas da vida dos pescadores da praia de Itapuã. "Não há nada no mundo que possa ser comparado a esse conjunto de obras de tom camerístico", diz Cravo Albin.



13. Pelo Telefone (Mauro de Almeida e Ernesto dos Santos, 1917, 5 votos). Controversa e polêmica, Pelo Telefone era originalmente uma criação coletiva de sambistas que tocavam nos saraus da Tia Ciata, no centro do Rio. Numa tacada de mestre, um dos comensais daqueles serões, Donga (Ernesto dos Santos), resolveu registrá-la numa época em que ninguém registrava canções ( a primeira entidade destinada a isso foi a SBAT, criada em 1916 por Chiquinha Gonzaga, cansada de ver suas músicas sendo plagiadas). Pelo Telefone seria também o primeiro samba carnavalesco gravado de sucesso (o primeiro se chama Em Casa de Baiana, de 1910). A letra, censurada, seria cantada por todos os foliões cariocas nos festejos de momo de 1917.



14. O Bêbado e o Equilibrista (João Bosco e Aldir Blanc, 1979, 4 votos) Aldir e João se conheceram no começo dos anos 70. Vivendo à distância, trocavam letras e músicas por correspondência. Criaram um vasto repertório genial, que vai de Kid Cavaquinho a Dois Prá Lá, Dois Prá Cá. Elis Regina, que era anti-bossa novista, a partir dos anos 70 passou a gravar compositores desconhecidos. Foi quando descobriu a dupla. O Bêbado e o Equilibrista se tornaria marcante por ser o hono da abertura política de 1979, celebrando a volta "do irmão do Henfil", Herbert de Souza, do exílio.

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