Thursday, August 11, 2016

Nostalgia


Metrô

Fico aqui comentando sobre histórias dos anos 80 e esqueço que já se passaram três décadas! Achava engraçado quando algum parente me falava dos anos 60. Parecia algo de priscas eras, como a própria expressão "priscas eras". Sentia uma certa inveja dos meus velhos. eles tomavam Grapette, liam a TV Intervalo, assistiam ao Bonanza na tevê e ainda viveram para comprar o disco mais recente dos Beatles.

Hoje eu me descubro convivendo com uma geração nova. A maioria deles nasceu pelo menos naquele tempo ou, mais tardar, nos anos 90. Logo, quando eu comento alguma coisa sobre os anos 80, nem percebo o quanto estou parecendo velhos para eles. Afinal de contas, o que são os 80 para essa gurizada de agora?

Às vezes, eu sou assomado por refluxos ao passado que me assustam. Outro dia, uma AM da capital começou a tocar o "Leão Ferido" do Biafra. Outras exatamente dessa época: "Time", com o Alan Parsons e "Na Hora da Raiva", com a Wanderléa. Mas nessa época, eu meio que estava descobrindo o que era ouvir rádio e música. E, nossa, eu ouvia isso no primeiro radinho de pilhas que eu tive. Não lembro a marca. Lembro que era azul. Esse é o tipo de música que você, quer goste ou não, se escutou-a quando era criança, mesmo séculos depois, sempre retorna à sua infância profunda.

Depois, a gente fica inventariando fatos e eventos. E tenta dar sentido algo que o tempo foi apagando na nossa memória — ou, pelo menos, jogou em alguma gaveta esquecida do nosso distraído esquecimento. Depois, a gente compara o tempo de nossos pais, o nosso tempo e hoje. E eu fico pensando: muita coisa que eu vivi está perdida para sempre, como um filme que eu assisti e esqueci da história — lembro apenas que o assisti um dia.

Um deles, e que me marcou já a pré-adolescência foi o "Conta Comigo" que, esta semana, comemora 30 anos do lançamento. Assistindo a um clipe dessa película no Youtube me fez proustianamente voltar à 87. Eu acabei assistindo ao "Conta Comigo" por causa da trilha sonora (desculpem se minha cabeça só funciona com música junto). Eu gostava de do wop e rock dos anos 50 (e não me perguntem o porquê, não foi por influência de ninguém) e detestava quase tudo o que tocava no rádio.

O curioso é que, justamente, as músicas que mais nos trazem essa nostalgia são coisas que não tinham quase nada a ver com o que eu ouvia ou gostava na época. O que eu realmente ouvia nos anos 80 passava longe do rádio. Porém, minha memória opera quando ouço aleatoriamente algum sucesso daquele tempo.

Magazine, Metrô, Herva Doce, Grafite, Kid Abelha, Dr.Silvana & Cia., Gang 90, Radio Taxi. Tudo aquilo que a gente zombava hoje tem um outro valor.

Quando ouço o "Leão Ferido" do Biafra ou o "Mamma Mia", do Grafitte, ou as canções da Blitz e aquele sunshine pop do começo dos anos 80 me lembram de quando eu estava no 1º grau no Positivo em Curitiba. Já quando voltei à Porto Alegre, em 84, o que mais tocava no rádio era a "Milonga para as Missões, do Borghetti que, inexplicavelmente, tocava em todas as emissoras de FM. Uma música instrumental no topo das paradas. Junto com ela, lembro de "Chuva de Prata" com a Gal ou o "I Just Call to Say I Love You" do Stevie Wonder.

Já quando eu estava nas Dores, eu quebrava lanças contra o que o pessoal gostava de tocar na hora do recreio. Tinha um garoto do 2? Grau que arrumava um jeito de fazer tocar OMD ("Enola Gay") quase todo dia. Até que veio a febre de RPM e Ultraje a Rigor.

Não tinha como fugir. O jeito era aguentar. Até que, no meu 2º Grau foi a febre de Guns e Roxette. Como disse o Verissimo a nostalgia consiste em sermos atraídos irressistivelmente em lembrar como fomos ridículos um dia.

Diria que o tempo faz maravilhas. De repente, por causa de uma música aleatória que toca no rádio, como a supracitada "Leão Ferido", nós acabamos voltando à nossa infância proustiana. E, de repente, eu me vejo diante do espelho, com o abrigo das Dores, passando a escova no cabelo e com o olho no relógio — como sempre, atrasado para o primeiro período. Vou ficar de molho na sala do Prof. Garcia mas pelo menos tem futebol no último período.

Lembro que eu passei pela febre da Ritchemania. Depois, reneguei que tinha aquele disco. Doei para uma tia. Hoje eu acho que quero o disco de volta. O tempo opera milagres.

Os anos 80 foram tão bons? Foram melhores do que os anos 60, ou é tudo bravata? De repente, nem os anos 60 foram tão bons assim. A nossa memória pode pregar peças na gente. Se a gente esqueceu, é porque viveu? Quem costura todo o tempo perdido viveu aquele passado?

O que ficou? O meu segundo movimento depois do movimento involuntariamente regressivo e tentar salvar o que ainda recordo. Anotar alguma coisa que uma música nós devolve, como se fosse um rescaldo de um grande incêndio. Uma década que durou vinte anos e, de repente, não tenho conta de tudo o que aconteceu.

Minha memória entra no cinema e o filme era "La Bamba", no Cacique (quando a gente comprava um pacote de bala de hortelâ da Neugebauer e ficava três sessões seguidas no Cacique ou no Scala, que era perto da minha casa). E lá estava eu, no Surf Balroom, olhando o Buddy Holly fazendo mudanças de acordes na sua Fender. No "Conta Comigo" tem uma música dele, é "Everyday" (foi quando eu comecei a colecionar discos e a me interessar por rock, algo ultimamente tão fora de moda). E eu era um dos Crickets. Mas, na verdade, eu tinha ciúme das meninas fazendo escândalo com o RPM.

Não aguento mais estudar, quero ser um rockstar. Eu achava os Replicantes repelente. Hoje eu corro atrás daqueles discos, nem que seja em Mp3. O tempo empena milhares. E o Metrô? Acho que me apaixonei retroativalemte pela Virginie. Aliás, o Metrô está de volta! É bom saber que o tempo passou e esse retorno não tem nada de doloroso, até nos dá uma sensação de segurança. Quem sabe se a gente pudesse ter a cabeça de hoje e viver tudo aquilo de novo? Acho que esse é o desgraçamento mental que bate em todo ser humano que bate na porta dos 40. Sinceramente, hoje eu posso falar. Não vivi os 60, mas os anos 80 foram melhores.

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