Saturday, January 22, 2011

O Caso Dreyfus e o espírito de manada


O livro

Esses dias eu estava pesquisando sobre o Caso Dreyfus e, eis que de repente, me caiu nas mãos um livro excelente sobre o episódio. É "O Caso Dreyfus: Ilha do Diabo, Guantánamo e o Pesadelo da História" (Companhia das Letras, Louis Begley, 232 págs., R$ 45).

A história é conhecida, porém não muito conhecida por todos. A idéia de Begley foi fazer o que todo jornalista faria para rerquentar um assunto antigo: criar um gancho entre o fato pretérito e a atualidade, e essa é a grande sacada do livro.

O autor pegou o caso do oficial judeu do exército francês que foi injustamente acusado de espionagem. Alfred Dreyfus foi apontado como autor de uma carta suspeita encontrada no gabinete do tenente-coronel Schwarzkoppen, então adido militar alemão.

Alguém fazia espionagem para os alemães. Dreyfus seria o único suspeito de ter escrito o borderô, foi levado a um tribunal e condenado ao degredo na Ilha do Diabo.

O caso dividiu a opinião pública entre os "dreyfusistas" e não-dreyfusistas". Begley pega o caso para comparar com a querela dos condenados à morte em Guantanamo pelos atentados de 11 de setembro.

Ao compará-los, ele nota uma semelhança entre o antissemitismo que grassava na França no fim do século XIX e o preconceito contra muçulmanos perante a opinião pública norte-americana.

Ou seja, se para muitos franceses, na época da degradação de Dreyfus, ele foi parar na Guiana porque merecia, muitos americanos (segundo pesquisa mencionada no livro), independente de qualquer lisura no julgamento dos suspeitos, eles estariam presos por algum motivo, mais precisamente esse pré-julgamento é motivado pelo fato de serem muçulmanos.

Louis Begley faz um paralelo genial entre o clima de antissemitismo francês e a forma como Marcel Proust retrata aquele momento histórico em sua obra, inclusive na Recherche.

Em Em Busca do Tempo Perdido, ele demonstra que a cocote Odette de Crècy, pafra conseguir estabelecer um núcleo de diletantes e artistas em seus soareés, ela fazia questão de demosntrar que era contra Alfred Drayfus.

Logo, perente a opinião pública, a questão acabou saindo dos meandros bizantinamente judiciais para uma esfera totalmente diversa. Enfim, tratada com toda a superficialidade que qualquer tipo de preconceito requer, mesmo no caso dos prisioneiros de Guantanamo. Louis fala: é claro que existem de fato criminosos que merecem estar ali, mas o julgamento a que eles são submetidos é tão torpe quanto à do tribunal militar que transformou Dreyfus num inimigo do povo. É judeu? Então é culpado.

Proust, (que era ascendência judaica por parte de mãe), também comenta que, após a compovação que o ofocial era inocente, a história cuidou de apagar o episódio nos anos seguintes.

Emile Zola foi quem resolveu jogar a carreira de escritor pelo alto e escreveu uma carta aberta a Felix Fauré, presidente da França, no L'Aurore. O texto, hoje notório, foi o ápice da carreira do escritor de Germinal e a sua desgraça. Zola acabou virando tão mártir quanto Alfred Dreyfus. Bergley salienta que o que Emile Zola mais queria era se tornar membro da Academia Francesa. Depois de publica o seu implacável "Eu Acuso", se tornou um pária: se candidatou enão recebeu nenhum voto.

O clima era exasperador: o tema acabou dividindo o país de tal forma que criou uma cisma onde judeus eram perseguidos, ao mesmo tempo em que o Caso Dreyfus virou um mote para que republicanos e monarquistas rilhassem os dentes. Um julgamento de um oficial abalou a França na última década do Século retrasado.


O libelo de Zola

Zola mudou os rumos do processo contra o oficial francês mas pagara o preço de sua bravura: foi condenado por difamação e se viu obrigado a exilar-se na Inglaterra. Além da injusta degradação à Ilha do Diabo por cinco anos, a revisão do processo provou, quase uma década depois que o autor do borderô era o major Walsin Esterhazy. Ele não foi condenado, fugiu da França e continuou a combater os dreyfusistas.

No fim das contas, o livro de Louis Begley mostra pelo menos uma evidência: a história gagueja e que o calor da hora dos acontecimentos é a moldura ideal para que fatos, instituições e pessoas sejam corrompidas pelo espírito de manada de todos nós em julgar a sorte de tudo e de todos.

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