Thursday, April 09, 2015

A Variant Verde


Grenal em 1969


Segundo a Wikipedia brasileira, a "mala preta" é o nome dado ao "incentivo em dinheiro fornecido a uma equipe desportiva para perder uma partida contra uma segunda equipe, de modo que o resultado da partida beneficie uma terceira equipe (geralmente a responsável pelo pagamento)".

Não sei qual é a origem da expressão. Mas ela me recorda de uma cena do começo do filme "Moscou Contra 007", onde o armeiro da inteligência britãnica oferece ao agente secreto uma maleta com um truque numa forma apócrifa de abri-la que salvaria o oficial inglês no fim da fita. Aqui, antes da expressão mala preta, havia a "gaveta". O atleta recebia um suborno para "ir para a gaveta", o que dava no mesmo.

A questão é que, a despeito do folclore, essa história de subornar jogador era moeda comum no futebol gaúcho lá pelos anos 50 e 60. Histórias de times inteiros engavetados. Mas, como se sabe, muitas suspeitas, muitos nomes, mas nenhuma comprovação.

alguns casos foram parar na imprensa. Uma foi em 56. O presidente do Internacional, Manoel Tavares da Silva, foi acusado de comprar o juiz Hans Lutzkat pelo próprio, que o denunciou ao Ib Kern, do A Hora. A proposta, de facilitar as derrotas gremistas, tinha como pano de fundo tentativa de Soares de consolidar a gestão colorada no futebol, a fim de melar a oposição de Ítalo Michelin, com vistas à vencer as eleições do clube.

No fim, Hans entregou o suborno ao repórter do A Hora. O presidente do Inter negou tudo. No fim, o Grêmio foi campeão gaúcho daquele ano e Michelin seria eleito presidente alvirrubro.

Problemas como esse obrigavam a Federação gaúcha a recrutar árbitros de fora. Um juiz paulista, um certo Mr. Davis, foi convidado para apitar Renner e Grêmio. Na hora aprazada, desistiu. O boato: ele teria sido subornado a desistir. Outro repórter de A Hora, Roberto Rohnelt, foi à São Paulo e confirmou a gaveta: porém, a grana tinha partido do próprio Grêmio.

Rohnelt voltou com a história toda. Descobriu que o suborno não vinha de um reles comensal, mas do presidente do clube.

Ao saber do "furo", o então prócer gremista, Fernando Kroeff irrompeu na redação do A Hora, na esquina da São Pedro com Roosvelt, para impedir que o editor do jornal, Aníbal Di Prímo Beck, impedisse a publicação da matéria.

Perplexos, repórter e plantonistas assistiram, de longe, a discussão entre Kroeff e Beck. Derpois que aquele deixou a redação, o editor do matutino disparou:

- Vocês vão dar a matéria, mas sem tocar no nome do presidente.

Ao que pareceu à ele, durante a edição, o furo foi parar no Olímpico. Alguém entregou Rohnelt a tempo - se não, A Hora teria dado Kroeff na primeira página. durante a coleta de dados, em são Paulo, ele soube da curiosa vilegiatura do prócer tricolor na capital paulista na semana anterior através de Sarará, ex-jogador gremista. No fim, nunca se soube quem foi o delator da redação do jornal: Kroeff morreu em 1997 sem contar a ninguém.


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Me lembrei disso esses dias. Alguém me relembrou de uma história curiosa, envolvendo o ex-lateral-direito do Inter de Porto Alegre, Édison Madureira. Vindo do Metropol, seu empresário era uma espécie de rábula de porta de vestiário (que inclusive o prejudicaria, tempos depois, envolvendo suspeitas de mala preta, mas isso é outra história).

Na véspera de um Grenal de 1970, apareceram na concentração colorada dois homens (um de mala preta) e foram ter com Daltro Menezes, então o treinador. eles se identificaram como agentes do antigo SNI e, declarando-se colorados, afirmavam (sem prova nenhuma, porém) que o zagueiro-central Valmir Louruz e Madureira, estavam engavetados. Daltro foi pressionado a sacá-los, mas não o fez.

Também não quis tirar os jogadores do Inter dias depois, quando os dois agentes reapareceram no Beira-Rio afirmando que Madureira iria ganhar um carro e Louruz, uma grande soma de dinheiro. Continuou reticente em manter os dois jogadores, quando a misteriosa dupla voltou com detalhes: Édison iria ganhar uma Variant verde.

Daltro não contou nada à eles. Não acreditava naquela embaixada do SNI e achava que era potoca. Durante a semana, porém, Madureira pediu para "passar em casa". Reapareceu na concentração com uma VW 1600 sedan, ou melhor, uma Variant verde, novinha em folha.

Volmir e Édison foram escalados. Agora a pressão era contra o próprio Daltro, que poderia, aos olhos dos cartolas, estar na mesma gaveta dos outros dois. a pressão não durou muito: até o próprio Madureira providenciar o segundo gol do Inter e a vitória alvirrubra. Depois, no vestiário, Menezes quis saber de onde havia aparecido aquela Variant verde:

- Ué, daquela revenda da Azenha, obra — riu Madureira.

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