Thursday, August 17, 2017

Tom Donahue e a grande revolução do FM


"Big Daddy" Donahue

Tava lendo um livro que é uma tese do Kim Jefferson Simpson, Hit Radio and the Formatting of America in the Early 1970s, um livro sobre economia política da comunicação e sobre a indústria fonográfica e contexto histórico americanos entre o fim da contracultura e os anos 70 na América. É um resgate interessante mas, ao mesmo tempo, é um tema que valeria a pena ser abordado aqui no Brasil. Ou por outra, existe, mas ainda é muito pequena.O livro é sobre contracultura e o começo das FM nos Estados Unidos na perspectiva de economia política e formação de programação musical.

No livro, ele revela que o Donahue cansou da estagnação do 40 hit format e resolveu migrar de mala e cuia para o FM ainda experimental. De uma hora para a outra, largou a estabilidade de DJ e partiu em busca de um desafio, que era explorar o FM. O cara podia tocar o que ele quisesse, então ele foi um precursor do free format no FM, ainda experimental, em 67, que descambou para o AOR, e isso foi um movimento que calhou bem na época, combinando o rock progressivo emergente e o começo do FM comercial no segmento jovem.

O AOR — album oriented rock foi o caminho para as rádios progressivas, pois o FM podia tocar discos inteiros em detrimento dos compactos. Aqui no Brasil quem implantou isso aqui foi a Eldorado, quando obteve concessão do FM em 72, progressive rock. Pois sempre se associa o Big Boy ao Wolfman Jack, e ele sempre se identificava com o Jack, mas eu percebo que tem uma ligação estreita com os programadores do FM free format com o Big Boy, que na Mundial estabelecia um padrão 40 Hit e na Eldopop o progressive sound (importante destacar o formato progressive não impede que a programação tenha outros subgêneros do rock, como o hard rock ou o rock dos anos 60) , elaborando sequências em rolo que eram copiadas de discos que muitas vezes eram transmitidos na íntegra, como o Phaedra, do Tangerine Dream que, todos sabem, é uma puta tijolada de 40 minutos direto sem escalas.

Claro que, antes, porém, a Federal AM de Niterói (de onde saiu o Luiz Antônio Mello, da Flu 'Maldita') já tinha programação rock tocando Neu, Tangerine Dream, Faust, Can, Soft Machine, era esse o tipo de música. Como as vinhetas da Eldopop diziam na época: “uma nova experiência sonora", também fazendo um link com música eletroacústica e minimalista, uma verdadeira pororoca musical de novas tendências, muito além das praias do pop.

E o progressivo entrou como uma luva no conceito de FM no começo. No free format eu poderia tocar o A Love Supreme todo, no AM nem a pau. O Donahue concebeu o projeto na KMPX e na KSAN, ambas em San Francisco em abril de 67, ou seja, antes do Pepper’s. Aqui eles poderiam programar um Giant Steps, depois um Days of Future Passed, depois um Eric Satie, era um campo aberto para todas as possibilidades.

O problema é que, enquanto o progressivo, que não tinha espaço no rádio britânico (que só iria desenvolver o FM bem mais tarde), nos Estados Unidos ele foi o esteio do novo formato das FM. E aqui, é provável que o Big Boy conhecesse na época a WNEW-FM, que era a FM progressiva de Nova York. Quando caiu para ele o pepino de implantar uma FM no Rio, ele não pensaria duas vezes em conceber uma rádio progressive que, como diz o Peixinho no documentário do Big Boy, não podia tocar o que tocava na Mundial. Ou seja, não podia retransmitir e nem ter a mesma programação musical, certamente por causa da concorrência direta.

Porém, a verdade é que a Eldopop, enquanto segmento de rádio rock no FM, só teria concorrência a partir de 77.

Assim, por cinco anos, ela criou um modelo de rádio rock segmentada que não só não tinha interferência de qualquer departamento comercial ou de orientação de gravadoras quanto estava introduzindo um tipo de música no Brasil que não tocava em lugar nenhum — ou porque era comercialmente inviável, como no caso do krautrock, que era uma coisa de iniciados — e que era novidade na época, já que aqueles discos tocavam logo quando foram lançados, lembramos que o Phaedra era de 1973, então muita coisa de progressivo que tocava na Eldopop era lançamento mas, em geral, o progressivo tinha uma barreira, que era o descompasso entre a agenda das grandes gravadoras brasileiras, que certamente exploravam mais a música nacional (em português, independente de rotular de brega ou MPB) e teletemas em geral e o desinteresse total dessas gravadoras com o rock, desinteresse que perdurou até o começo dos anos 80. Então, eu acredito que mais do que uma rádio vitrolão de ricos, como podem rotular alguns, ela foi uma experiência que estava colocando o ouvinte brasileiro em contato com a música jovem (e as vinhetas da Eldopop sempre diziam “FM! Estéreo! Jovem!”, ou “Som contemporâneo” da época, longe do sucesso do AM.

Quer dizer, o mercado ainda explorava massivamente o AM e subestimava o rock nacional, o que não dizer do internacional? Basta lembrar o veto que os Mutantes levaram do seu O A e o Z e a agonia do Vímana em conseguir lançar um disco pré-produzido pronto em 1977 e que, no fim, virou um único single, “Zebra”, e que passou batido. Eram tempos em que o rock e a indústria fonográfica no Brasil ainda não andavam de mãos dadas.

Agora, pegando o livro do Kim Jefferson Simpson, a gente percebe que lá não havia esse descompasso, e o progressivo e o hard rock eram mainstream. O que existia era a divisão entre o progressive format e o MOR, ou middle-of-the-road, que era onde tocava o cocktail music ou o soft rock, e o Simpson fala que o soft rock foi uma espécie de reação ao contexto marcadamente negativo dos Estados Unidos com mortes em Kent, Nixon, Vietnã, que nasceu como um lenitivo, um soporífero aos ouvidos daqueles dias políticos. Ao mesmo tempo em que o bubblegum pop foi uma reação das gravadoras, criando grupos como Archies, Osmonds, Box Tops (!) para combater o pessoal do rock que estava fazendo rock freak AOR para vender ao público pré-adolescente/adolescente da época (fim dos anos 60).

No caso de Donahue, ao lançar mão do free format, seria possível incluir na programação um tipo de música que jamais havia tocado no rádio. Para tanto, basta pegar o caso do Sgt Pepper's Lonely Hearts Club Band. O disco foi praticamente banido na BBC e nenhuma das faixas fora concebida como single. Paradoxalmente, o trabalho mais incensado dos Beatles não tinha espaço no AM. Mesmo assim, Sgt. Pepper's foi o gatilho que deflagrou a mudança na estética do rock, de focar no formato conceitual de álbum em detrimento do single. A partir dessa concepção, muitos músicos podiam dar-se ao luxo de produzir canções para o Top 40 e dedicar o álbum para voos mais altos.


1 comment:

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