Tuesday, October 05, 2010

O Câmera do Leão


Walmor Bergesch, fundador da TV Gaúcha. Ao lado, uma das famosas câmeras do Canal 5


Outro dia, um operador de áudio me contou uma história muito engraçada, lá dos tempos dos primórdios da televisão aqui no Rio Grande do Sul.

Foi assim: uma vez, a TV Gaúcha fez um teleteatro da Paixão, era O Manto Sagrado - foram, ao todo, três capítulos de uma hora cada, isso em 1963, quando a TV Gaúcha não era da hoje RBS.

A novidade era que, dessa vez, eles iam, pioneirísticamente, fazer externas, loucura de um famoso diretor da época, o Nelson Vaccari. Por exemplo, a filmagem passada na história na ilha de Creta foi feita aqui na Ilha do Presídio. A atriz tinha que saltar de uma altura de quase dez metros (tinha uma equipe de resgate, claro) e não sabia nadar, imagine. Tiveram que fazer seguro de vida para ela, era a Rosa Maria, então esposa do radialista Pedro Amaro.

Até a Elis Regina fez uma ponta como uma hebréia, cantando, a cena foi filmada na praia de Ipanema (a de Porto Alegre, lógico).


Mas as histórias de bastidores são folclóricas.

Um ator que fazia o Demetrius foi manejar um arco e flecha e quase matou o cinegrafista. Para a cena da orgia de Herodes, eles puseram uma equipe de prostitutas. Eles haviam recrutado menininhas inocentes que, sob o olhar zeloso das mães, não podiam mostrar pernocas, decotes, nada. Então foram chamar umas garotas lá no Beco do Oitavo. Quase acabou em putaria.


Contudo, a melhor foi uma cena em que os cristãos são cruelmente atirados às feras, num circo em Roma. Era o ápice. Tipo, uma liliputiana tevê do extremo sul do Brasil querendo dar uma de Cecil B de Mille. Eles gravaram tudo no antigo campo do Cruzeiro de Porto Alegre, na rua Natal.

E fizeram todo o cenário de época comme il faut, cobrindo os alambrados para fazer de conta que era uma muralha de pedra, colocaram a multidão, devidamente fantasiada. Também destacaram uma tropa da Brigada Militar para servir de legionários. O 'povo' ficava naquela arquibancada que ainda existe, hoje na subida do cemitério João 23.

Mas faltava o leão, né. Aí acharam um, num circo do interior. Botaram ele camuflado atrás das "pedras" dentro da jaula, e soltaram no "circo romano" vazio com um cameraman instalado num buraco no chão, pra filmar o leão "atacando" os cristãos em contra-plongée (num ângulo de baixo para cima), com o objetivo de imprimir mais veracidade à cena...

O câmera ficava escondidinho num buraco camuflado com madeira e serragem por cima, com um furo no forro só para a lente captar a cena e o leão. Foi quando soltaram o nosso intrépido rei das selvas que, ao invés de passar batido por cima do cameraman, ele escorregou e caiu de cara justamente no buraco.

Tipo, o leão ficou enterrado no buraco com a bunda de fora. Foi um cagaço geral na equipe, o camera simplesmente se borrou todo e desmaiou. Não foi devorado pelo bicho acho que por falta de espaço. E não ia conseguir sair sozinho.

Aí a equipe foi puxar o animal pelo rabo. Quando ele saiu, ele ficou putíssimo da cara, saiu correndo e, no auge do seu leonino estresse, foi atrás de todo mundo, deu uma patada violenta numa escada, desmontou a escada, depois foi tentar entrar na jaula e errou o buraco da "mureta de pedra" e desmanchou o alambrado do estádio.

Prá quê.

Porra, imagine, o público ali viu o bicho e saiu correndo, eles bateram todos os recordes de salto em altura, em distância, salto com vara, pentatlo moderno, imagina, os caras escalando aquela mureta de merda de tão íngreme.

Depois ele voltou para o campo, e só um diretor e mais um "legionário" conseguiram acalmar a fera já ronrronante, de barriga para cima, com duas "lanças" de cabo de vassoura.

Esse camera depois foi trabalhar na Globo, essa história foi bastante difundida por anos e o rapaz na câmera, o James, ganhou para sempre o apelido de "o câmera do leão".

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