Thursday, November 14, 2013

Beatles no Ar!


John, Paul, George e Ringo, chegando para mais uma sessão na BBC


Depois de 15 anos do lançamento da primeira compilação, a Apple lança o material restante das sessões de gravação que os Beatles realizaram para a BBC de Londres: On Air—Live at the BBC Volume 2.

As gravações, reunidas em dois CDs, chegaram às lojas na última segunda (11) com alguma divulgação. Ao todo, o quarteto participou de 52 programas produzidos pela emissora estatal britânica, entre 1962 e 1965. A maior parte das aparições dos Fab ocorreu nos programas Saturday Club e Pop Go The Beatles, em 1963 e 64. De certa forma, a visibilidade franqueada pelos microfones da BBC foi um passo importante para pavimentar o caminho da banda ao sucesso.

Por outro lado, o contrato com a Beeb (como seus ouvintes a chamam) também estimulou John, George, Paul e Ringo a ensaiar consideravelmente: todos os programas eram gravados ao vivo e, para preencher a parte musical de suas participações, eles se viam obrigados a fazer algo que suas apresentações regulares ao vivo não permitia: revolcar muito do velho repertório do grupo. Coisas do tempo em que eles realmente precisavam ser ecléticos, amalgamando tanto standards de Elvis Presley dos velhos tempos da Sun, como I'm Gonna Sit Right Down And Cry Over You, I Got a Woman ou I Forgot to Remember to Forget (dava para ver que os Beatles sempre apostavam nos lados B do Rei) ou coisas do Tim Pan Alley, como Beautiful Dreamer (não exatamente Tim Pam, mas uma canção do Stephen Forster do século XIX, numa tenebrosa versão ieieiê), Honeymoon Song (lembram de Falling in Love Again ou Red Rails in the Sunset?) ou Till There Was You (essa depois definitivamente integrada ao repertório dos Beatles).

Muitos fãs da banda só travaram contato com esses tapes quando do lançamento da primeira coletânea, intitulada Live at The BBC, lançada em 1994. Fato é que praticamente todo essa material era conhecido dos bootlegers (colecionadores de discos pirata, não oficiais, de artistas em geral) desde o começo dos anos 70. A febre do bootleg apareceu a partir do fim dos anos 60 e cresceu bastante nos anos 70, até o advento do CD.

No caso dos Beatles e a BBC, alguns colecionadores explicam que os tapes das sessões da rádio inglesa já eram prensados ilegalmente desde o disco Yellow Matter Custard. Pertencente à era paleolítica da pirataria, esse é um dos elepês mais raros para colecionadores. Muitas versões de discos feitos com gravações da BBC, no entanto, eram de péssima qualidade, contrastando com outros, com ótima qualidade. Estes, com efeito, eram prensados com matrizes oriundas de rolos oriundos dos próprios arquivos da BBC.

Fato é que, de 1973 a 1994, todos os programas dos Beatles na BBC foram lançados em discos pirata, e das formas mais variadas. A mais célebre, contudo, é a Beatles at the Beeb. Como acontece com a maioria delas, a origem dos masters e a produção é apócrifa. No entanto, a qualidade das edições e o lay-out de capa de cada um deles era de primorosa qualidade. Quem é do tempo deve se lembrar: nunca houve um momento - pelo menos na história da discografia pirata beatle, de se disponibilizar material alternativo do quarteto de forma tão interessante.

O único ponto "negativo" é o excesso de diálogos e a intromissão de artistas que sequer tinham algo a ver com os Beatles (como Bobby Vee). Por sinal, é sabido que a Beeb possui rolos e mais rolos de outros artistas/cantores em seus arquivos. Por exemplo, não se sabe por que os programas dos Rolling Stones nunca saíram oficialmente.

Além disso, o estado de conservação e gravação desses tapes era muito boa a despeito de se tratar de material de qualidade inferior aos discos oficiais. Por isso, muitos colecionadores imaginavam que uma edição oficial possibilitaria ter acesso à produção dos Beatles na BBC em qualidade impecável. No entanto, após ouvirmos o Lve at The BBC, o que se viu foi apenas a masterização daqueles mesmos tapes. O que dava a volta por cima foi o fato de que, a partir de então, os fãs poderiam travar conhecimento com um lado escuro da banda, interpretando muitas canções que ficaram de fora dos álbuns oficiais - além de mostrar o amor eterno de John, Paul, George e Ringo pelo R&B americano, numa época em que os americanos haviam enterrado o rock and roll (como Lennon fala na entrevista à Rolling Stone, em 1970).

Pois bem: vinte anos depois, a Apple desembarca o derradeiro lote de canções da BBC. Dessa vez, restaram covers em sua maioria; ou seja, não existe muita novidade. A não ser a inclusão de Lend Me Your Comb - que não saiu em 1994 mas foi listada inexplicavelmente no CD 1 do Anthology 1. Outra foi a aparição de I'm Talkin' Bout You. Cover de Chuck Berry, por conta da precariedade da gravação, ela foi deixada de fora do original Live at the BBC por conta do impoluto Sir George Martin, que a achou com péssima qualidade de gravação. Já o cover dos Beatles, por sua vez, é excelente (e melhor que a dos Stones!).

O que faltou dessa vez foi uma outra versão de I Got to Find My Baby (melhor que a apresentada no CD de 94) e uma segunda versão (mais rápida) de A Shot of a Rhythm'n Blues. Destaque para outro cover de Sure to Fall, uma versão de Roll Over Beethoven bem centrada, com a bateria "fechada" e Sir Paul (do tempo em que ele tinha voz, e que voz!) berrando o clássico de Chan Romero (e grande pedida dos tempos do Cavern) The Hippy Hippy Shake.




O curioso é que, na época da aparição da primeira coletânea, a potoca que haviam criado era a de que alguém havia "encontrado tapes esquecidos dos Beatles na BBC" - quiçá com o objetivo de transformar o lançamento em fato novo. Na verdade, requentando aqueles tapes que, por sinal, não eram esquecidos de maneira alguma: a BBC tem horas e horas de programas com artistas pop gravados e em boa qualidade (diferente do que acontece no Brasil, por exemplo, onde se fazia palimpesto de rolos e cartucheiras de rádio). A bola da vez foi fazer uma base de dados em cima de possíveis gravações realizadas porventura por ouvintes da Beeb. Na verdade, não vá se iludir: todo esse material está preservado na BBC de Londres. Aliás, sempre esteve.

Para quem nunca ouviu, fica a lição de como esses quatro sujeitos, a despeito de todas as limitações (deles como músicos, e de estúdio, sem falar de instrumentos), conseguiam ensaiar e tocar direitinho ao vivo, e ainda conseguiam transmitir charme e segurança em suas interpretações. John Lennon - naquela mesma entrevista supracitada à Rolling Stone, havia dito que as melhores performances ao vivo dos Beatles não foram gravadas. Bem, pelo menos, do rol de bootlegs ao vivo da banda, os dois discos dos Fab na BBC de Londres dão uma idéia do que era assistir a uma meia horinha de programa de rádio com esses quatro caras legais.

2 comments:

Ana Lira said...

Lembrei de você lendo isso:

http://contraversao.com/copiando-vinil-guia-ilustrado/

Marcelo said...

Oi Ana :)