Tuesday, March 06, 2012

O Götterdämmerung de Erico Verissimo


Escritou publicou O Arquipélago há cinquenta anos


Esse ano se comemora o lançamento do último volume de O Tempo e o Vento, do Erico Verissimo. A Globo optou por lançar a terceira parte da trilogia em três volumes, protelando a derradeira parte para março de 1962.

Verissimo planejou a terceira parte da saga dos Cambarás com o nome de Encruzilhada. Mais tarde, e bem mais tarde mesmo, ele mudou para O Arqupélago, e a razão é bem interessante.

Como se sabe, e como explica o verbete, um arquipélago é um conjunto de ilhas e/ou ilhéus próximos uns dos outros. Depois de narrar a formação, o povoamento e a consolidação do Rio Grande do Sul, Erico foca a história na desagregação tanto da elite campeira do estado, a partir da estagnação das charqueadas e a ascenção dos imigrantes como força de trabalho no sul e, em paralelo, a desagregação do pr´´oprio núcleo familiar de Rodrigo Cambará, o chefe do clã.

O Retrato, publicado em 1951, narra a história de Rodrigo Cambará, que é o primeiro Cambará doutor da família. Junto com a atividade como clínico em Snata Fé, ele opta pela política, defendendo o Civilismo de Hermes da Fonseca contra o continuísmo político borgista - representado por Laco Madruga, chefete local.

A paixão política se mistura com as histórias de Rodrigo, tipo fiolgazão e mulherengo da pior (!) espécie. O livro termina com a morte de Pinheiro Machado, em 1915. No começo de O Retrato, no entanto, há uma cena que se passa em 1945. Com a Revolução de 30, Rodrigo havia se tornado um comensal da corte de Getúlio Vargas e defendeu o regime do Estado Novo até sua queda, quando ele deixa a Capital Federal para refugiar-se com sua família, em Santa Fé.

No Arquipélago, assim como em O Continente, a narrativa ocorre em dois momentos paralelos: uma, Reunião de Família, como em O Sobrado, é o entreato familiar onde se desenrola uma situação dramática. Rodrigo está de cama depois de um enfarte. Está desenganado e, ao redor dele, se desenrola todo um drama familiar de pessoas que estão irremediavelmente isoladas umas das outras mas que, com efeito, acabam tento que se unir numa situação adversa debaixo do mesmo teto.

Aliás, as cenas de crise coronária de Rodrigo são inspiradas num episódio real: Erico era cardíaco, e um ataque quase o matou no meio da feitura dos livros da trilogia. Verissimo levou um largo tempo para concluir a redação de O Arquipélago, entre paradas de meses e anos, ele escreveu parte em Porto Alegre, parte durante férias em Torres e nos Estados Unidos (Alexandria, na Virgínia), quando viajou para lá na ocasião do casamento de Clarissa, que já residia lá há algum tempo.

O livro retoma a saga do filho de Licurgo, num misto de novela e romance histórico. Já casado e prometido por Pinheiro Machado, acaba se tornando deputado pelo PRR, para mais tarde desertar para o lado dos maragatos quando estoura a Revolução de 23.

Talvez um dos momentos mais geniais, e que pega a pena de Erico no seu melhor momento, nas páginas onde ele recupera, com uma maestria de poeta épico, todos os movimentos da Revolução de 23 em Lenço Encarnado. Aqui também surgem outros personagens ligeiramente queirosianos, como o Tio Bicho e Aarão Stein.

Também passando pelo romance histórico, Erico conta a pequena epopéia do irmão de Rodrigo, Toríbio que, depois de deixar as hostes de Honório Lemes, ele decide seguir Luis Carlos Prestes com a famosa Coluna, indo parar no Nordeste. A história, no entanto, é real: o tio de Erico de fato seguiu o desacreditado tenente de Santo Ângelo na tentativa de derrubar Arthur Bernardes quando todos capitularam pelo fato de que Bernardes e Borges se engalfinhavam e este teve que assinar o Pacto de Pedras Altas, pondo fim ao governo continuísta de décadas no Rio Grande do Sul.

Verissmo também aproveita os convescotes no Sobrado com os amigos de Rodrigo para fazer romance de tese, discutindo desde estética até política. Tio Bicho é, na verdade, o coro da tragédia; assim como acontece com o Dr Winter no Continente, Erico fala pela boca do Tio Bicho que é um personagem do Eça que o Eça esqueceu de criar, um misto de João da Ega e de sátiro grego e só não rouba a cena mais do que o sogro de Rodrigo e pai de Flora, o seu Aderbal Quadros.

Aderbal é o típico homem cordial e distraído, pordeu suas terras por ser bom demais e confiar em fio de bigode, não se mete em briga e vive para cultivar árvores que recebem nomes de gente, em seu sítio. Rodrigo também vive um conflito com seu filho mais velho, Floriano. Dessa relação parental que surge o perfil psicológico de O Arquipélago.

Floriano puxa pela mãe, não tem o espírito belicoso dos Cambará, é um intelectual, escritor como Erico e vive o drama de ser criticado pela pretensa superficialidade de seus livros e é cobrado a tomar partido de alguma causa, fato que ele dá de ombros e é acusado de burguês e omisso, por seu irmão mais novo, Eduardo, que é membro e militante do PCB.

Nas discussões políticas entre Floriano e Tio Bicho passa muito da óótica e da ética de Verissimo como escritor, além do próprio gosto de Floriano (e Tio Bicho) por música clássica, mote e assunto que aparece o tempo todo no livro.

Além dessas atribulações, Floriano vive um amor não resolvido com Sílvia, que está por se casar com seu irmão caçula, Jango. Ao contrário de Floriano, ele é um homem do campo. Sílvia fica entre dois corações, ao mesmo tempo que ele fica dividido entre ela e uma americana, Mandy, que ele conheceu no Rio de Janeiro. A titubeação de Floriano, uma de suas "virtudes" faz com que ele perca Sílvia, quando ele enfim descobre que a ama de verdade - quando já é tarde demais.

Verissimo também inova ao escrever um capítulo no foco narrativo da Sílvia, quando ela escreve um diário onde tenta elaborar a situação de ser uma mulher dividida, e tanta com resignação e fé escolher entre Floriano e Jango. No fim, ela pensa como uma típica personagem feminina de erico Verissmo da linhagem de Ana Terra, Bibiana e Maria Valéria. Ao escolher Jango, ela zela pela "integridade" do núcelo familiar. Toda escolha é dífícil e só poderemos encontrar lógica em sua escolha dentro do perfil de mulher agregadora de sua linhagem. Foi assim (consciente e insconscientemente)que Bibiana reteve o Sobrado, e é assim que Sílvia arrega a tocha para a geração seguinte.

Ao mesmo tempo, ele tem um acerto de contas com Rodrigo, quando eles re reconciliam depois de uma catarse. Mesmo com todas as perdas, de seu pai e de Sílvia, Floriano renasce e resolve escrever a saga dos Cambará: é quando a trilogia termina no começo de o Tempo e o Vento. Ele se senta à máquina, depois de voltar ao Sobrado de madrugada, e escreve as primeiras frases: "Era uma noite fria de lua cheia...".

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