Friday, August 20, 2010

Uma taça e um sonho




Meu amigo Parsifal me mandou isso, ontem. Ele é colorado fanático, e tem mais ou menos a minha idade.

Ele me disse: "cara, me lembro quando o Inter foi campeão do Supercampeonato de 2002. Era o primeiro título desde, sei lá, acho que 1998",disse. Aí me falou que saiu com a camisa do clube na rua e ouviu de dois gremistas, na rua (minto, na fila da Biblioteca da PUCRS, ele disse). "Só porque ganharam esse campeonatinho tiraram a camisa do armário".

Quase se botou no autor do gracejo. Mas se segurou. Depois foi o drama do Brasileiro daquele ano, e falou daquele São Caetano e Inter, na última rodada: o Inter precisava de 3 pontos para a vaga na Libertadores e levou 5 em São Caetano do Sul.

O cara adoeceu, tava com o complexo de Vira-Latas incubado. Depois, a duras penas, veio aquele jogo contra o Boca, em 2004. Um desastre em Buenos Aires, a ilusão da reação no jogo de volta. Goleiro do Inter sofreu um gol sintomático, de clube que tem sapo enterrado. Bola bate nas costas dele e entra. Azar de perdedor. Me disse que sempre que saía na rua, um gremista amigo dele inticava: "ão ao ao, só ganha gauchão!".

disse que a saída do jogo era um misto de orgulho por disputar uma parelha numa partida de caráter internacional e de frustração. Ele disse que sacudiu um amigo na frente do Celeiro de Ases, sentpu no meio-fio e chorou lágrimas de esquicho.

"Porra, cara, essa é a nossa diferença deles! Quando a gente tava em baixa, eles aproveitaram e chegaram no topo. Quando eles estão em baixa, o nosso time não sabe aproveitar! É o time do quase mesmo, droga!". E as lágrimas caíam para os lados, como um filme mudo. Era a imagem do palhaço da ópera.

Veio 2005 e e Campeonato Roubrasileiro. E a anulação dos jogos. "pora, mas como pode?", ele dizia, crispado de espanto. Fim do ano, ele, putíssimo, berava: "porra, cara, roubam a gente daquela maneira e essa direção de merda fica comemorando os 30 anos de 75. mas o que é isso? Prêmio de consolação era uma Libertadores. Mas era tanta injustiça que o limão ia virar limonada.

Ia porque o Inter era favorito e perdeu o Gauchão mais ganho de todos os tempos e em casa. Veio a Libertadores e o resto todos sabem. Mas, como dizia o Sinatra, o melhor ainda estava para vir.

Problema era o complexo de vira-latas — diz ele mas, como qualquer torcedor, ele entende que até é uma hipótese plausível. O xis da questão era entender como o clube conseguiu superar o doloroso estigma de ser o time "do quase" e de viver do passado só para elaborar tudo como um ciclo que acabou. É um problema de muitos times, independente da torcida. Nelson Rodrigues tecia inúmeras tesas sobre isso, principalmente quando ninguém imaginava que fosse possível colocar o futebol no divã. O sapo era psicológico.

Mas o engraçado foi ver o cara ontem. Tava todo de vermelho, com uma lata de cerveja, e vivendo numa espécie de transe, de mundo paralelo. Parecia que tinha visto a face de Deus na sarça de fogo e havia descido do monte com as tábuas da Lei. E a sua cabeleira tinha um quê de bíblico, de Moisés de Cecil B. de Mille.

Ele nem acredita. Ninguém acredita, mas tanto faz. só sei que largou o psiquiatra. E o Internacional definitivamente também. É aquela coisa; se a história tem um fim, ela tem que terminar com uma taça e uma volta olímpica. a explicação que fique para os deuses do futebol. "Se a bola bate nas costas do goleiro hoje, ela sai prá escanteio", ri o meu amigo Parsifal. Ele bebia a cerveja com uma sede brutal e ria pelos cotovelos feito um fauno,feito a Laranja Irritante. A cerveja saía pelo nariz dele.


Ah, ele disse que achou o cara que tirava onde dele. O Parsifal olhou para o sujeito de alto a baixo, bateu no distintivo da camiseta e bradou: "ão, ao, ao, só ganha gauchão!!!!!".

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