Friday, October 24, 2014

O inocente banho de tanque

Quando era criança, um dia muito quente podia representar um refrescante banho de tanque no fim da tarde. Era com alegria imensa que eu entrava no tanque de concreto que existia na minha casa no bairro Santana. A água gelada era apenas sentida em um primeiro momento, porque depois era só diversão.
Falo isso porque tive que conviver com o banho de tanque na manhã de hoje, algo que jamais pensei ser possível na altura dos meus 48 anos. Uma pequena reforma no meu banheiro impossibilitou o banho tradicional de chuveiro por 24 horas. Restou-me o impensável tanque que fica na área do meu apartamento.
A água estava fria, mas a alegria não estava lá. Os tempos são outros, a vida já não é mais sem as preocupações infantis. Também lembrei que é muito difícil ver cenas dessas nos bairros tradicionais. Moro no Menino Deus, que cada vez mais está sendo ocupado por prédios de apartamentos, acabando com as casas tradicionais. Ali, criança nem sai mais de casa. Não as vejo na rua jogando bola, brincando de pegar, jogando taco. Tem muito carros por causa do Hospital Mãe de Deus. Tem moradores de rua cobrando pelo estacionamento gratuito em área que não é Azul.
A exceção é uma casa de madeira, a única do bairro, de gente pobre, honesta e trabalhadora. São os netos da dona Pondonga, que jogam bola na calçada no final da tarde. A bola, por sinal, é velha, surrada e, acho, até furada. Mas os guris nem se importam. O que vale é a diversão, o sonho de ser o jogador de futebol que faz gols e não aquele que ganha somas estratosféricas. A criança não pensa no dinheiro, em sair da pobreza, quer é fazer gol, fazer a defesa fantástica, correr para a galera, ser aclamado pela torcida.
A inocência da criança, o descompromisso com o futuro, a alegria da diversão. Lembrei disso tudo em um banho que durou poucos minutos, na bica de um tanque de concreto.

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