Wednesday, May 16, 2012

A primeira vez que eu encontrei o blues

Tive a oportunidade de ver pela primeira vez um show de blues ao vivo. Já tinha assistido o Eric Clapton no Gigantinho nos anos 80, mas era um show de rock. Ontem vi Buddy Guy e escrevi uma nota que foi publicada no Correio do Povo Online. Transcrevo ela aqui com um adicional: o público gaúcho é mal-educado. Durante o show, vários foram os que iam ao bar buscar cerveja e depois saíam novamente para tirar a água do joelho. De resto, um grande espetáculo.
A vitalidade não é a de um senhor de quase 76 anos (faz aniversário em 30 de julho). Parece um cara de quarenta e poucos. E quem escuta a sua guitarra berrar, diz que Buddy Guy seque chegou nos 30 anos. O show da noite desta terça-feira, no teatro do Bourbon Country, teve apenas oito músicas inteiras, alguns solos e brincadeiras com grandes sucessos. Durou aproximadamente uma hora e meia, não teve bis e ninguém reclamou. Pelo contrário, só ouvi elogios rasgados ao mestre de blues, fonte inspiradora de Jimi Hendrix e Eric Clapton.
O show começou com “Nobody understand me but my guitar”, do album Can't Quit the Blues (2006). Em seguida, o cara das camisas de petit pois soltou o hit de Muddy Watters, seu ídolo, “Hochie Coochie Man”. Foi o suficiente para quebrar o gelo, se é que em algum momento esteve frio o show. O público cantou junto. Buddy fazia solos infindáveis de guitarra. Fez duelo de sons com o excelente pianista Marty Sammon e com o guitarrista Ric “Jaz Guitar” Hall. Tim Austin, baterista, Orlando Wright, baixista, completam a excelente banda do bluseiro americano. Na sequência, Buddy Guy tocou outro clássico de Muddy Watters: “She’s 19 years old”. Quando os primeiros acordes de “Fever”, de Peggy Lee, foram tocados, a galera foi ao delírio. Buddy comandava o público com solos de guitarra em volume baixo seguido de rasgadas exibições de sua habilidade.
Ele também homenageou Albert King, Jimi Hendrix e Eric Clapton. Fez um pequeno solo de “I miss you” do Rolling Stones. Desceu do palco e caminhou no meio do público, que não soube respeitar o ídolo e tratou de cercá-lo, impossibilitando quem estava mais longe de apreciar o espetáculo. Quando voltou ao palco para tocar “Someone else is steppin’ in”, Buddy reclamou das rádios. “Eu não sei por que as rádios não tocam mais blues hoje em dia”, comentou. Tocou “Sunshine your love”, do Cream com a mão esquerda, usando um paninho, esfregando a guitarra nas costas, com uma baqueta, tudo o que podia fazer. Por fim, homenageou o seu maior parceiro, Junior Wells, com “First time i meet the blues”. Encerrou o show e ficou dando autógrafos no palco e jogando palhetas para o público. Foi o suficiente para entrar na minha lista de shows inesquecíveis. Deixo aqui uma pérola que ele não cantou no show. Todas as fotos são de Tarsila Pereira.


Wednesday, May 09, 2012

Música & Lugares

De volta com a série, para animar o blog: Memory Motel, canção dos Rolling Stones para o disco Black And Blue, de 1976. A letra fala de uma experiência de Jagger ou de Richards com uma roadie meio metida a independente, quando eles viajaram pelo sul dos Estados Unidos antes da famosa turnê das Américas, no ano anterior. Eles ensaiaram em Baton Rouge, Louisiana, antes da jornada de apresentações. Mick escreveu a música quando esteve por alguns dias justamente em Montauk, na casa do Andy Wahrol. Uma curiosidade: a versão de estúdio de Memory Motel não conta com a participação de Keith ou de Ronnie, mas sim de Harvey Mandel e Wayne Perkins nas guitarras solo e acústica, respectivamente, enquanto Billy Preston cuidou do piano e dos sintetizadores.
A fachada do Hotel, em Montauk, Nova Iorque.

Monday, May 07, 2012

Oh my God, Am I here all Alone?



Dylan






Clima de boteco, muita gente bebendo e fumando, alguns conversando à parte, o som não estava tão alto, a banda era honesta, não havia telão, o sistema de som era passável, embora muita banda de sambafunk da Cidade Baixa rejeitasse os equipamentos, a iluminação era de teatro universitário (a luz era projetada contra os músicos, dando um ar de peça surrealista ao vermos as sombras deformadas contra o pano cinza), o repertório era interessante, típico blues de Memphis com alguma coisa surrupiada de cançonetas pop, só o cantor que chamou realmente a atenção: um senhor de prá lá dos setenta, usando um chapéu, mais parecendo um redneck aposentado das bandas do sul, com uma voz rascante e opaca, o que se sabia é que você pode não pensar ao olhar para ele, mas ele foi famoso há muito tempo atrás tocando violino elétrico em Desolation Row --- sim, senhoras e senhores, eu estou falando do Bob Dylan.

Achei um tanto peculiar ficar imaginando que ele fez um show que não tem nenhum clichê de apresentação mainstream, nenhuma badalação da imprensa, nenhum apelo visual, ninguém fez qualquer coisa que ousasse sair do óbvio - inclusive com Dylan perfeitamente à vontade tocando suas canções menos arrebatadoras para um público que se não é fá, ficou ou ficaria ligeiramente perplexo, e ficou, até porque a recíproca era verdadeira: não existe nada mais desapaixonado do que m fã de um cara que, mesmo que, em determinadas fases da vida, sempre procurasse o seu público, na verdade, ele pode se dar ao luxo de desprezá-lo, anão ser que ele o queira para fazer o que ele quer que todos façam, que é parar para ouvi-lo.

Eu mesmo, que achei que fosse ter um troço ao vê-lo diante de mim, fiquei perplexo com a sensação que eu tive o tempo todo, e que foi rigorosamente o que eu escrevi naquela pequena frase do primeiro parágrafo. Talvez uma banda coverizando Dylan parecesse impecável, Dylan consegue ser comum. Podia ser um ilustre desconhecido tocando num bar de honky tonk no interior dos Estados Unidos, um artista mambembe da Redenção. é incível ver alguém tão à vontade em ser comum.

Dylan chega a ser comovente pelo fato de que ele está velho, e sabe envelhecer com dignidade - e fazendo o que ele gosta, e o que eu gostaria de fazer quando chegasse na idade dele. Gostaria de ter uma banda para tocar o meu repertório, esquecer família e transformar a estrada profunda em meu doce cotidiano. Digo isso porque fico até sem jeito, até depois do show e de conhecer o velho Dylan, que eu fico sem jeito de me considerar um fã dele. acho que eu introjeto a atitude dele, aquela que ele mitificou involuntariamente, a do vamos todos ficar doidões de Rainy Day Women, e essa, a do Dylan velho, do outro Dylan de voz apagada, e que nós temos que aprender a gostar. Eis o que eu queria dizer: fácil é curtir o Velho novo Dylan; difícil é curtir o novo velho Dylan.

Em tempo: prefiro os dois.


PS: Achei legal que ele tocou canções dos discos que eu mais gosto dele, o Blood On The Trachs e o Highway 61 Revisited. Pena que ele alterou tanto a tonalidade das músicas que era ipossível cantar junto. Mas eu me emopcionei especialmente com Simple Twist Of Fate, que é a minha preferida do disco, lançado em 1975.